segunda-feira, 9 de março de 2009

CAOS SOCIAL, VIOLÊNCIA E ALMA

Suelly Drozdek Março / 2009

“A psique esta longe de ter uma unidade;
pelo contrário, é uma mistura borbulhante
de impulsos, bloqueios e afetos contradito-
rios e seu estado conflitivo, para muitas pessoas
é tão insuportável que elas desejam a salvação
apregoada pela teologia “ Jung, 2000.

A sociedade perplexa assiste a desintegração de todas as suas Instituições (família, escola, cidade, país e planeta). O crescimento da violência em todas as frentes culturais e sociais provocam guerras, terrorismo, seqüestros, crimes passionais, pedofilia, motoristas alcoolizados que matam nas ruas e estradas da cidade, drogas e assassinatos cometidos por crianças dentro das escolas, etc...

Aparentemente a violência está fora de controle e as pessoas se perguntam se este descontrole emocional da humanidade terá fim ou se estamos caminhando segundo forças psíquicas incontroláveis que buscam e promovem a auto-destruição e a destruição da sociedade que as contém.

Por que as forças e mecanismos sociais e culturais que têm por função estabelecer limites e valores básicos que mantém a existência de grupos humanos estão falhando?

É importante que a Psicologia, como ciência que estuda a psique participe da compreensão desses fenômenos sociais.

Sabemos que a psique transita continuamente entre o bem e o mau, impulsos construtivos e destrutivos, amor e ódio, e entre todos os pares de opostos possíveis para uma mente viva.

Doce ilusão acreditar que se possa conviver psiquicamente em harmonia e homeostase, com nossos impulsos e conteúdos imagéticos.

Em contra partida, o avanço da tecnologia, a expansão cultural, a mídia e a estimulação de consumo, a exposição exagerada da psique (caótica por natureza) ao caos das possibilidades infindáveis de satisfação de instintos e necessidades, podem estar gerando um quandro de violência e egocentrismo.

O mundo contemporâneo é caracterizado pela riqueza das diversidades mas também pela patologia do individualismo e da transitoriedade que nos abandona na ausência de vínculos duradouros e amorosos. O descompromisso que testemunhamos diariamente nas ruas, nos meios de comunicação e até mesmo no interior da família lembra a euforia adolescente da compulsão de se tentrar lançar a todas as experiências a que nossa psique, voraz e complexa como é, instiga e convida. Mas, o mundo da fartura é também o do vazio e, o efêmero convive com a multiplicidade em um espaço em que a diversidade das demandas da alma deixa de estar a serviço do Self para satisfazer somente às demandas de um ego envaidecido por seus vários talentos.

O homem moderno corre o risco de se iludir com tanta diversidade e, embriagado dessa suposta liberdade, distanciar-se do equilíbrio saudável e necessário para a psique individual e coletiva. A patologia do nosso século não é exatamente a pluralidade de capacitações e escolhas que nos são apresentadas, mas a distorção que fazemos entre a vivência simbólica e intrapsíquica dessa pluralidade e a sua concretização. Quando estamos a serviço de satisfazer somente às demandas do ego envaidecido, corremos o risco de ficar distante do contato saudável com nossa alma, garantido principalmente pelos vínculos que estabelecemos com nossos semelhantes. Quando nos permitimos viver todas as possibilidades psíquicas que são forjadas em nossa consciência, descompromissamo-nos com os outros e com as suas necessidades (deles!). Não raro, acabamos transformando o “outro” em objetos a serviço de uma fantasia narcisista e onipotente.

Para vencer esse processo de sedução em que a psique nos envolve ao propor tantas possibilidades de vivenciar a realidade e suas infinitas possibilidades de obter satisfação é preciso reconhecer a importância de haver uma mão que nos segure nesse aprofundamento psíquico que às vezes “perde a mão” e pode nos levar a toda sorte de desavenças no interior da família e da sociedade. Em ultima instância, essa viagem ao interior da multiplicidade psíquica sem controle, pode remeter a quadros psicopatológicos graves de vícios (alcoolismo, drogas, sexo) e a toda a sorte de abusos (pedofilia, crimes passionais) etc...

Essa mão que segura e resgata da indiscriminação e da loucura, é a melhor imagem de uma tão necessária estabilidade egóica no caos incompreensível trazido pela emergência das pulsões do Id.

E o que permite ao Ego navegar pelo caos psíquico mantendo a possibilidade de estabelecer vínculos sadios e criativos consigo mesmo e com o outro? É a alma! Esse veiculo que é a encarnação das forças construtivas da psique: A capacidade de formar e manter vínculos, de agir com criatividade, de ter compaixão, de postular valores éticos e de revelar a transcendência arquetípica humana.

Adoecemos quando perdemos nossa alma, quando nos desconectamos dessa “entidade”, cuja principal característica esta associada as capacidades de estabelecer relação com o si mesmo (Self) e com o outro e, que nos coloca a serviço da aceitação de nossas diferenças (opostos) dentro e fora de nosso mundo psíquico. Nossa alma é o veículo que nos permite aproximarmos do estrangeiro, do diferente de nós, condição necessária para permanecermos em grupos.

Sem a mediação da alma, nossa tendência é a de nos submetermos aos favores oferecidos por uma suposta liberdade que nos faz negar nossos vínculos e compromissos éticos. O caminho da Individuação deixa assim, de ser um caminho solitário para ser apenas um caminho de solidão.

Justamente por representar esse aspecto relacional, inerente à criatividade e à compaixão, a alma permite a harmonização (e não a eliminação!) dos aspectos destrutivos da psique, criando a capacidade de dialogar com as polaridades divinas e humanas e assim, legitimizar as relações entre os indivíduos com seus desejos e necessidades mútuas, resultando em tolerância.

Colocada a serviço da verdadeira Individuação, a alma harmoniza os opostos dentro de nossa psique e conseqüentemente dentro de nossos relacionamentos.

As desigualdades que testemunhamos nas ruas e nas violentas divergências sociais e culturais, são o lamentável resultado de uma mentalidade que ainda não atingiu a maturidade da alma no exercício de sua transcendência.

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